04/10/2016
24/08/2016
Quadrilha dos deuses
Vulcano
amava Vênus que o traiu com Marte...
Vulcano,
o deus deformado e rejeitado, irado com as traições da esposa foi demonstrar a
insatisfação ao seu pai Júpiter – genitor de Vênus e de Marte, também.
-
Estimado pai, estou abaladíssimo com o adultério de meus irmãos. Quero que o
senhor tome providências.
-
Vulcano (o pai não o chamava de filho), somos deuses, ciúmes é coisa de
gentinha. Não me envolverei nos seus problemas, os meus são maiores.
O
deus do fogo potencializou seu rancor com mais uma indiferença. Para não
explodir, foi ao Vesúvio insultar com blasfêmias seu panteão.
Quem
mais sentiu e sofreu foi Pompeia que acabou sepultada pelas lágrimas da
tremenda erupção.
24 de
agosto de 2016, quarta-feira – dia de Mercúrio.
Mercúrio,
outro filho de Júpiter e seu mensageiro oficial, foi convocado durante a
madrugada para levar uma missiva a Netuno; irmão de Júpiter, conhecido como o
garanhão dos mares, por conta de suas relações com as Ninfas, Sereias e tantas
outras entidades.
-
Pô, pai! São três da manhã, hoje é meu dia. Posso levar isso depois?
-
Insolente! Claro que não...
Contrariado,
o jovem chega ao tio em um pulo. E entrega o seguinte texto:
Estimado
irmão,
Como
andam as forças nessas correntezas da eternidade?
Oh, meu fraterno senhor das águas, sinto falta daqueles
tempos nos quais éramos mais admirados, com relações mais sólidas, por mais
insólitas que parecessem. Hoje, a monotonia corrói o ponto mais alto do meu etéreo
coração.
Livrando-se de sentimentalismos tolos, estava aqui com
Mnemosine, desfrutando de doces recordações, uma em especial me trouxe sua
festiva figura, dada a natureza amorosa do fato.
Há exatos 1937 anos, da contagem humana, uma dor de
cotovelo daquele seu sobrinho ferreiro provocou um grande pânico, lembra como
rimos daquilo tudo?
Pobre Vulcano, além de coxo, c o r n o...
Com
homéricos amplexos,
Júpiter.
Com
a delícia da reminiscência, Netuno não se conteve e soltou uma tremenda
gargalhada e novamente os sentimentos dos deuses abalaram a Itália.
Netuno
também é conhecido como o deus dos terremotos.
17/06/2016
Sobre Muralhas
Mais um dia, diferente daqueles vividos sob olhares atentos de vigias.
Estou na biblioteca construída pelo Estado no lugar dos pavilhões abarrotados
de esperanças perdidas.
Na capital das edificações de paradoxos, este é o meu: vir aqui todos os
dias. Mais de um terço da minha vida passei encarcerado na consequência de meus
atos; para mim, certos no momento de suas execuções – tive meus motivos e
eles me cegaram. Não sou um bicho qualquer, sei bem quais são os valores morais
da sociedade, os individuais e os limites de ser humano.
Quando o tempo permitiu a assinatura da minha alforria, ganhei a
solidão. O pouco que tive, perdi antes do fim do jogo. Saí sem perspectivas e
dignidade. Disseram que eu estava apto a retornar ao convívio detrás do muro,
mas ninguém me aceitou nesse mundo veloz, cheio de novos aparelhos, gente e
pouca solidariedade. Mendiguei.
Após o grande massacre de números velados, o Estado com um mea
culpa cinematográfico demoliu os prédios – depois de abri-los à visitação
de pessoas inocentes cheias de desejos culpados e curiosidades sombrias (qual o
sentido de conhecer uma prisão? Preparar-se para cumprir a pena de seus
defeitos?) Como no genocídio, estive na implosão. Senti que mais uma parte de
mim estava virando pó. Vi subirem fantasmas de conhecidos, desconhecidos e os
meus próprios. Vi caírem certezas e incertezas. Passei três dias ali, aspirando
enxofre.
Com a demolição física surgiu minha reconstrução moral. No canteiro de
obras deste parque composto de biblioteca, faculdade, espaço aberto, árvores e
alegrias, me entregaram ferramentas. Cavava a terra, carregava pedras,
martelava minhas angústias e enterrei minha aflição. Sou parte disso tudo, do
fim ao recomeço.
Venho aqui todos os dias, para não deixar a memória dessa história dar
lugar ao esquecimento do recalque. Tomo meu banho de sol, sem marcação de
tempo. Caminho por alamedas calçadas ou morros gramados, raramente lembrando
dos corredores, quando eles querem me tomar de assalto vou ao prédio da
faculdade e caminho por lá, ainda é o mesmo prédio (já nos contaram bastante
sobre a igualdade de aparência entre escolas e prisões), assim não sou vencido
por meus medos, acolho-os transfigurando-me.
Nessa visita diária, vou à prateleira, pego o mesmo título da literatura
universal, sento no mesmo lugar e sinto o preenchimento da renovação.
Agora sou eu quem observa do alto os brotos nas ruínas.
Créditos da foto: Francisley da Silva Dias 16/06/16
Um Sonho de Liberdade - Domenico Calabrone
23/05/2016
14/04/2016
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